Entrevista Teresa Taylor Kay, Genéticista
Mais de metade dos casos de surdez são hereditários e, destes, uma grande parte está associada a outras doenças transmitidas pelos pais.
Hoje, é possível interromper esta linha de surdez hereditária através de Diagnóstico Genético Pré-Implantatório e técnicas de procriação medicamente assistida. Já se faz em Portugal.
Lúcia Carvalho Andersen jornalista
O que é o Diagnóstico Genético Pré-Implantação?
O diagnóstico genético pré-implantação (DGPI) é uma técnica diagnóstica que permite a obtenção de um diagnóstico genético num embrião e a transferência para o útero apenas de embriões não afetados pela doença genética analisada. Resulta da associação de técnicas de procriação medicamente assistida (PMA) e da análise genética do embrião antes da sua implantação. As técnicas de procriação medicamente assistida (PMA) maioritariamente utilizadas são a fertilização in vitro (FIV) e a microinjeção de um único espermatozóide no ovócito (ICSI – intracytoplasmic sperm injection), quando existe uma alteração da fertilidade masculina.
Em que casos se pode realizar DGPI?
Desenvolvido para casais com risco de descendência afetada por patologia genética grave nomeadamente: – Doença mendeliana grave – Anomalias cromossómicas estruturais – Doença mitocondrial – Doenças de expansão de tripletos
A sua realização é possível apenas nos casos em que foi possível caracterizar molecularmente o indivíduo com surdez na família, denominado caso índex, e determinar previamente a causa da mesma através da identificação das mutações genéticas causadoras de doença.
Considerando que nos países desenvolvidos cerca de 60% dos casos de surdez são hereditários (35% dos quais associados a outras patologias – surdez sindrómica – e aproximadamente 30% dos casos de causa genética com manifestação isolada – surdez não sindrómica) estão reunidas as condições para a aplicação da técnica de DGPI.
Como se realiza a técnica de DGPI?
Para dar início a este procedimento é necessário a referenciação a uma consulta especializada de medicina da reprodução, após o diagnóstico genético em contexto de aconselhamento genético na consulta de Genética Médica.
Nesta consulta de medicina da reprodução são avaliadas várias características do casal em causa, nomeadamente relacionadas com gestações anteriores ou questões de infertilidade que possam interferir com o sucesso do DGPI. Por vezes são solicitados exames complementares de ambos os membros do casal tais como histerosonosalpingografia ou espermograma.
A técnica de DGPI, em si, inclui também vários procedimentos específicos em cada elemento do casal. Estes procedimentos, do âmbito da PMA, consistem em estimulação ovárica através de medicação hormonal e punção folicular com aspiração de ovócitos com apoio de ecografia, sob sedação, na mulher e colheita de esperma para individualização de espermatozóides, no homem.
A fecundação é realizada posteriormente através da FIV e ou da ICSI e o teste genético é posteriormente realizado numa célula do embrião obtido (blastómero) através de biópsia embrionária com recolha de 1 ou 2 células ao 3º ou 5º dia após a fecundação (consoante a técnica utilizada pelo laboratório). Após o estudo genético específico do blastómero realiza-se transferência para o útero de, no máximo, 2 embriões sem doença genética a fim de tentar aumentar a taxa de sucesso da técnica e ao mesmo tempo evitar os riscos associados às gestações múltiplas (gravidez gemelar).
Pode também realizar- se criopreservação dos embriões, caso existam embriões em número excedentário, ou não existam condições para a sua transferência.
Duas semanas após a transferência de embriões é feito um teste de gravidez em sangue periférico (doseamento de beta-HCG) para verificar se houve sucesso na implantação do embrião no útero e posteriormente é realizada uma ecografia às 6 semanas para atestar a evolução da gravidez nomeadamente através da presença de movimentos cardíacos fetais. Posteriormente a gravidez é seguida pelo médico obstetra da área de residência do casal.
Onde se pode realizar esta técnica em Portugal?
Em Portugal esta técnica de reprodução medicamente assistida, no Sistema Nacional de Saúde, realiza-se apenas no Centro Hospitalar de São João no Porto, na Unidade de Medicina da Reprodução
Teresa Taylor Kay Consultora da Carreira Médica Hospitalar em Genética Médica e Ginecologia/Obstetrícia, Coordenador do Serviço de Genética Médica do Centro Hospitalar Lisboa Central (CHLC) – Hospital Dona Estefânia com doutoramento em Medicina na Faculdade de Ciências Médicas sobre o tema “Doenças Raras na Ilha de S. Miguel: Caracterização Epidemiológica
Diana Soraia de Oliveira Antunes Interna de Genética Médica do Serviço de Genética Médica do Centro Hospitalar Lisboa Central (CHLC) – Hospital Dona Estefânia